A Federação das Pescas está preocupada com os efeitos da implementação de novas áreas marinhas protegidas (AMP’s) nos Açores e pede uma revisão a todo este processo, assumindo que o objetivo, mais ambicioso na Região do que na União Europeia, de haver 30% do mar protegido e pelo menos 15% da sua área totalmente protegida até 2023, está a gerar uma “enorme pressão” no setor.
“A percentagem de área imposta e a pressa na implementação de AMP’s está a provocar uma enorme pressão, desconforto, desencorajamento ao investimento de comerciantes e investidores, e instabilidade junto dos pescadores açorianos que temem pelo encerramento da sua fonte de rendimento”, alertou ontem o presidente da FPA numa conferência de imprensa que decorreu no Clube Naval de Rabo de Peixe, onde, de resto, defendeu o alargamento dos prazos para as mudanças nesta área, de modo a aferir-se os impactos no que se refere a recursos marinhos e ao nível socioeconómico.
A Estratégia de Biodiversidade da União Europeia coloca a fasquia mais baixa do que o Governo Regional e o programa Blue Azores estabeleceram como objetivos, ou seja, proteção para 30% do mar e, dentro deste valor, cerca de 10% com estrita proteção, até 2030.
Gualberto Rita questiona a razão pela qual foi imposta a percentagem de 30% aos Açores quando Portugal como Estado-Membro pode delinear as áreas que pretende proteger, repartindo essas áreas entre as suas bacias marítimas.
O presidente da FPA lembra que, com o anterior Governo Regional, tinha sido fixado em 15% as AMP’s para os Açores, ao passo que, com o atual executivo, esse valor passou para 30% e a Federação não foi tida nem achada sobre o assunto.
O problema agrava-se perante a constatação que foram adicionadas à lista três novas AMP’s no arquipélago “que nunca foram discutidas, nem devidamente justificadas”: o Banco do Cachalote, Bugio e Diogo de Teive, com uma área total de 1076 quilómetros quadrados.
Os pescadores, pela voz também de Jorge Gonçalves, da Associação de Produtores de Espécies Demersais dos Açores (APEDA), entendem que, com as alterações que foram preparadas e que se encontram em fase de proposta, a área totalmente protegida do mar açoriano será “muito mais” do que 15%. “Há várias formas que nos levam a atingir (a preservação e sustentabilidade dos recursos) sem terem a agressividade que este tipo de AMP’s nos vão colocar”, argumentou.
Gualberto Rita chama a atenção que “cerca de 1% da ZEE dos Açores corresponde às zonas de pesca, detendo que existe o triplo de áreas marinhas protegidas do que existe para a pesca demersal, e com a implementação dos 15% de áreas marinhas totalmente protegidas (no-take), questionamo-nos onde é que os pescadores vão operar. Se as atuais zonas de pesca ficarem interditas, é certo que aumentará o esforço de pesca ao redor das AMP’s, provocando novos distúrbios”.
Para o dirigente associativo, fica claro que “a percentagem dos 15% ‘no-take’ não é viável para o setor poder continuar a trabalhar e para os armadores e pescadores terem o sustento para as suas famílias”. Na sua ótica, é preferível que exista uma “percentagem mais realista, que possa efetivamente ser fiscalizada e de forma mais eficiente, evitando pescarias abusivas e outras formas ilegais”.
De igual modo, a FPA questiona a capacidade de monitorização de áreas marinhas protegidas quando a Região não consegue garantir a fiscalização do seu imenso mar.
Na última reunião envolvendo o Blue Azores, a FPA ficou a saber que as AMP’s geram um impacto de cerca de 27.5% na pesca de fundo e de 7% na pesca de salto e vara, sendo que, para Gualberto Rita, os impactos na pesca apresentados por esse programa estão “muito aquém” da realidade.
Defendendo o contributo do Departamento de Oceanografia e Pescas (DOP) da Universidade dos Açores – até agora “pouco presente e pouco comunicativo” – no sentido da revisão do processo, a Federação frisa não concordar com o resultado do processo participativo no âmbito do Blue Azores, “uma vez que não tiveram em conta as necessidades, sugestões e alterações propostas pelo setor das pescas”. Todavia, lamenta, “é mencionada a nossa participação como se compactuássemos com o resultado final e estivéssemos envolvidos na tomada de decisão”.
A consulta pública do processo relacionado com a reforma do Parque Marinho e da rede de Áreas Marinhas Protegidas dos Açores estende-se até ao próximo dia 15 de setembro.Açoriano Oriental, 30 de agosto de 2023