Jorge Gonçalves considera que as Pescas não devem ser geridas de acordo com os “ciclos políticos de quatro anos” que podem colocar em causa a sustentabilidade dos recursos. Para a Federação, o setor não tem futuro sem ciência e juventude
18 de Abril de 2024, 10:07
Federação defende pacto de regime para setor das PescasAutor: Carolina Moreira
O presidente da Federação das Pescas dos Açores, Jorge Gonçalves, defende que o futuro do setor passa por um pacto de regime que assegure a sustentabilidade dos recursos.
Em entrevista ao Açoriano Oriental, no âmbito do aniversário do jornal, Jorge Gonçalves alerta que “o setor não pode ser gerido única e exclusivamente por questões e ciclos políticos de quatro em quatro anos, porque estamos a falar de recursos que nós não dominamos nem temos assim tanto conhecimento, e onde as alterações climáticas e não só têm várias vertentes”.
“Qualquer medida mal calculada ou mal tomada tem reflexos e impactos nos recursos que podem levar mais de uma década a recuperar, portanto o setor não pode ser visto de ânimo leve”, defende o porta-voz da Federação.
Para Jorge Gonçalves, a pesca nos Açores tem “futuro”, no entanto “a parte política tem de decidir o que quer para o setor, muito importante para a atividade económica da região pelos postos de trabalho que cria, pelo seu valor acrescentado, pela continuação territorial e a fixação de pessoas nas ilhas”, destaca.
E deixa ainda uma crítica: “O setor não tem sido visto de acordo com a sua realidade, há interlocutores que têm prazer em transparecer que o setor nasceu para ser miserável e o setor não é isso”, frisa.
O presidente da Federação defende ainda a necessidade de uma “reestruturação” das Pescas com vista à sua “sustentabilidade” e para que “as pessoas tirem rendimento”, considerando que esse futuro passa pela ciência, pela tecnologia e pela captação de jovens.
“Nenhum setor de atividade tem futuro sem ciência e jovens. Temos de cativar jovens para que o setor seja pujante e tenha futuro, sem isso está extremamente envelhecido. E não se vê jovens porque também não tem havido da parte da tutela medidas que os cativem para esta atividade”, aponta.
Quanto à tecnologia, Jorge Gonçalves afirma que tem permitido a evolução do setor. “Hoje em dia, o setor das pescas é bastante aliciante e completamente diferente do que era há uns anos atrás. A evolução da tecnologia fez com que um pescador atualmente tenha que ter conhecimentos de informática, de mecânica, interpretar correntes e condições atmosféricas, logo já tem uma panóplia de conhecimentos que não tem nada a ver com o que era a pesca exercida no tempo dos nossos pais”, destaca.
Defende também por isso a necessidade de mais “literacia e formação” nesta atividade, “para que a pesca se possa desenvolver mais e melhor, no sentido de pescar menos e procurar maior rentabilidade. E para isso é necessária mais formação, porque os recursos são finitos e têm de ser geridos de uma forma muito séria para garantir a sua sustentabilidade e o futuro”, alerta.
Jorge Gonçalves identifica ainda como desafios do setor a “implementação das Áreas Marinhas Protegidas e o ordenamento do espaço marítimo”, além dos transportes e das quotas.
“Os transportes são um elo essencial no desenvolvimento e no futuro das pescas, porque se não tivermos bons transportes não conseguimos colocar no mercado o nosso produto, que tem muita qualidade, de forma atempada e com preços aceitáveis de acordo com o custo de transporte”, explica.
Quanto às quotas “impostas pela União Europeia”, afirma que têm criado “vários problemas de rentabilidade ao setor” que apenas poderão ser ultrapassados com uma “discriminação positiva das regiões ultraperiféricas”, uma vez que “fazemos uma pesca sustentável e artesanal”.
Numa nota final, Jorge Gonçalves refere ainda o trabalho da Inspeção Regional das Pescas, que considera “essencial” para o “desenvolvimento harmónico da exploração dos recursos”.
“Não pode haver um polícia para cada barco, mas as pessoas têm de ser formadas para a responsabilidade da sua atividade e para a importância dos recursos para que se possa preservar o dia de amanhã”, alerta.
Federação afirma não estar contra a criação de Áreas Marinhas Protegidas
Jorge Gonçalves frisa que, ao contrário das “falácias que andam a circular”, a Federação da Pescas dos Açores e, “no contexto geral os pescadores, não estão contra as Áreas Marinhas Protegidas e sabem a importância das mesmas”.No entanto, o presidente da Federação afirma que “não concorda com a forma como o processo está a ser feito”, porque “não está a ser assegurado um plano de reestruturação para o setor”.
“Criando 30% de Áreas Marinhas Protegidas está-se a reduzir o esforço de pesca em 30%. Ora, se não houver uma reestruturação do setor que vá ao encontro da diminuição do esforço de pesca, em abates de artes de embarcações, nessa dimensão, nós não estamos a resolver um problema. Estamos sim a movimentá-lo e a agravar o problema noutro sítio”, considera.
Jorge Gonçalves destaca ainda que a criação de Áreas Marinhas Protegidas “não é o único meio para atingir o objetivo de preservar os recursos”, considerando ser “uma ferramenta, em conjunto com muitas outras”.
Recorda ainda ao jornal que a criação do Banco de Condor como área protegida foi uma sugestão do setor das Pescas.
Fonte: Açoriano Oriental, 18 de abril de 2024